segunda-feira, 26 de setembro de 2011

UMA QUESTÃO DE SEGURANÇA NACIONAL.


Fui a uma burgueria em Salvador e, ao pedir um sanduíche, percebi que a carne estava muito mal passada. Eu até gosto de carne meio crua, mas desde que seja pelo menos passada. Fui comendo o sanduíche pelas beiradas (literalmente), até que o sangue bovino começou a escorrer por todos os lados e então percebi que era inviável continuar.

Resolvi, portanto, chamar o garçom para encaminhar minha reclamação. O garçom consentiu que a carne estava crua, mas alegou que era “novato” e chamou um garçom mais experiente. O outro garçom, o dito “mais experiente”, também concordou que a carne do sanduíche estava crudelíssima, mas, mesmo sendo o tal “mais experiente”, não sabia como proceder e chamou o gerente.

O gerente, por sua vez, disse:
- Não está mal passada. Está à moda da casa.
Para quem não sabe, o termo “à moda da casa” é uma espécie de carta-curinga dos funcionários de restaurantes para justificar qualquer problema com a comida.

Reafirmei para o gerente que esta muito mal passada, mas o mesmo insistiu em utilizar a carta-curinga tirada da manga. Aleguei que os seus próprios subordinados (os garçons) haviam consentido, assim como todas as pessoas que estavam comigo na mesa, mas meu esforço foi em vão. Os garçons, a propósito, ficaram constrangidos em ter que assumir, na frente do próprio chefe, que o sanduíche estava cru.

Resolvi, então, promover uma enquete no estabelecimento para analisar o estado da carne do meu sanduíche. Abordei os clientes de mesas vizinhas, permiti que eles manipulassem o sanduíche e analisassem. Todos os clientes abordados consentiram que estava crua mas o gerente, que observou tranqüilamente a execução da enquete, ignorou o resultado e insistiu na carta-curinga “à moda da casa”.

Coincidentemente, percebi que o proprietário do estabelecimento estava presente e relatei a minha frustração para ele. O proprietário conversou com o gerente, que logo veio recolher meu sanduíche.

Alguns minutos depois, para minha surpresa, um garçom veio entregar o meu mesmo sanduíche (aquele todo mordido pelas beiradas), mas agora com a carne muito bem passada. Esta atitude me impressionou pois, pelo pouco que eu sei, um dos princípios básicos de higiene em cozinhas industriais é que, uma vez que o alimento é manipulado (tocado ou comido) pelo cliente, não é permitido que retorne à cozinha.

Esta precaução deve ser tomada pois, se o cliente tiver alguma doença, a cozinha será contaminada e, conseqüentemente, os alimentos dos outros clientes. No caso de um burgueria, entendo que esta questão seja ainda mais crítica, pois todos os sanduíches compartilham de uma mesma chapa (que não é eleitoral, mas culinária).

Neste caso, além de mim e meus colegas terem provado, o sanduíche passou nas mãos de vários clientes durante a realização da enquete. Expliquei isso para o gerente e orientei que o correto era que ele tivesse providenciado outro sanduíche, mas a sua resposta foi:
- E quem vai arcar com o prejuízo?

Esta é uma pergunta típica de funcionários que não têm real comprometido com o negócio. É até compreensível quando vêm de funcionários de baixo escalão, mas inadmissível quando vem do próprio gerente do estabelecimento.

O custo marginal de produzir mais um sanduíche é infinitamente inferior ao custo intangível de prejudicar a imagem de uma empresa e de “conquistar” um cliente insatisfeito, que pode e tem um terrível efeito viral.

Este caso relatado serve para ilustrar alguns dos problemas comuns em bares e restaurantes, em decorrência da mão de obra desqualificada. Segundo dados do Sebrae, 76% dos funcionários de bares e restaurantes não recebem treinamento profissional.

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