A minha avó Georgina tinha um biótipo apropriado à prática da condição de mãe duas vezes. Era gorda – enorme de gorda –, com os cabelos grandes, mas tão grandes que exigiam duas empregadas para serem penteados e era portadora de catarata, cuja cirurgia, ao tempo, não se fazia como hoje, de forma simples e corriqueira.
Mas era uma pessoa ótima, dispensando-me um tratamento especial, chamando-me, como me chamava, de Toinho. Veja só o leitor! Sentava horas seguidas a contar histórias; histórias que trazia de seu tempo . Vez ou outra misturava as fábulas e as lendas com a realidade nua e crua da seca de 77. Esse foi um período de muito sofrimento no Nordeste. Era um horror ouvir essa conversa de tanto padecer, anos depois!
Tinha predileção especial pelo relato fabular de um certo drama familiar, da morte de uma mãe e o terror da madrasta que assumira essa posição parental.
A filha, de tanto ser maltratada e perseguida por ela, termina enterrada no jardim, de onde canta: "Jardineiro de meu pai /Não me corte os meus cabelos,/ Minha mãe me penteou, minha madrasta me enterrou, /Pelos figos da figueira que o passarinho bicou. /Xô passarinho, xô passarinho, da figueira de meu pai.".
E o jardineiro ouvindo essa toada convocou o pai da criatura e assim tiraram a moça, salvando-lhe a vida. E a madrasta ruim foi mandada embora. Encontrei a história por inteira na Internet, mostrando que a rede virtual é muito mais do que se pensa.
O quase conto de minha infância perdeu o sentido no mundo atual. A madrasta não é mais, como fora, substituta da mãe desaparecida para sempre.
Agora, os casais se separam com uma frequência inusitada, razão para se ter outras formas de parcerias conjugais. A família mudou, há novas mães e novos pais, filhos e enteados. Sendo assim, por vezes a constelação parental cresce, fica enorme, com mulher e ex-mulher, marido e ex-marido, filhos de um e filhos de outro. Todos num grande convívio. Tudo isso sem falar de avós e avôs.
E a figura má, odienta, da madrasta desapareceu no tempo e no espaço. Já nem acho mais graça nas cerimônias de casamento, porque penso, no mais das vezes, que de pouco serve a benção do sacerdote, os acepipes da recepção, igualmente, de nada adiantam, o destino é o mesmo: separam-se.
Uma outra história do fabulário em geral, é aquela da formiga e da cigarra. A primeira guardando o que podia para os dias de falta, para o inverno, sobretudo e a outra sem se incomodar com o porvir das coisas, cantando e se deleitando com a melodia.
Até que a carência alimentar se instala e a precavida formiga tem que atender aos reclamos da desesperada cigarra. A narrativa tinha a valia de lembrar à criançada a importância da economia.
Por isso recebi de minha mãe um cofre de metal polido com a inscrição: “A economia é a base da prosperidade”. Não consegui ser rico – não desejo isso -, mas tenho sido ao longo da vida contido com os meus recursos financeiros, parcos sempre.
Nego-me a gastar por consumo apenas, sou daqueles que calculam o benefício de um bem.
Bom! Entrou por uma perna de pato, saiu por uma perna de pinto, senhor rei mandou dizer que contasse cinco.
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