quinta-feira, 17 de novembro de 2011

OLHA A MACAXEIRA ROSA...


O Salvador do antes, dos meus anos de calças curtas e dos meus tempos de juventude, era muito diferente desta cidade do hoje! 

Naqueles dias, as compras de casa eram feitas na quitanda da esquina e a caderneta da bodega servia para intermediar as negociações todas, da farinha e do feijão, do sal e do açúcar, do pão que ia pra mesa e do milho para alimentar as galinhas do terreiro. 

Aos sábados, porém, a feira das Sete Portas encantava os olhos do menino. Carrinhos de tábua com rodinhas de flandre, brinquedos de todo tipo, da borboleta que batia as asinhas de madeira fazendo barulho aos cavalinhos de pau. 

Ali, minha mãe abastecia a despensa, com a féria do pai, comprando frutas e verduras, escolhendo a galinha gorda e a charque ao gosto muito particular das criadas, como costumava chamar a minha avó Georgina. 

Depois, Bico Fino, o carregador efetivo da família, reunia tudo no balaio e trazia prá casa, arriando o peso na soleira da porta da cozinha, pra alimentar a parentada: pai e mãe, filhos em número de quatros e mais a avó e mais as empregadas Adelina e Cóta!

Família numerosa, pois! Nunca vi tanta gente junta numa casa só! Não se fechava a porta de frente, tal o movimento, senão à noite, para a proteção de todos e desgosto dos gatunos!

Nas ruas, entretanto, passavam vendedores variados, a oferecerem produtos diferentes, também. E disso me lembrei há poucos dias, quando encontrei o homem da macaxeira, que traz o tubérculo em carroça de metal, estilizando a venda ou modernizando a oferta. 

Olha a Macaxeira Rosa, ainda grita, preservando a tradição. Havia vendedor de tudo, do doce japonês e do cavaquinho, do cuscuz e das frutas, de verduras também, como do amendoim torrado e cozinhado, triturado, às vezes, em deliciosa farinha. 

Tinha também o taboqueiro e o pirulito do galo. Quase não se vê mais gente de tabuleiro à cabeça gritando o produto da terra ou gente carregando balaios de frutas tropicais, de manga ou de caju, de pinha ou de cajá, de jabuticaba ou de pitomba.

As crianças de hoje não se incomodam mais com o refrão: “Chora menino/Pra comer pitomba...”. E nem as mães da pós-modernidade conhecem a cantiga! 

Ninguém sabe mais que naqueles outroras o verdureiro passava logo cedo, empurrando uma carrocinha de cor azul ou verde, toda em madeira, com tela de arame trançado e entrançado protegendo e arejando o espaço do chuchu e do maxixe, da cenoura e do jerimum, do quiabo e da batata inglesa que é tubérculo, nem do tomate, fruta por derradeiro. 

Mais tarde vinham os vendedores de laranja, um deles gritando o produto e o outro carregando dois sacos, com a mimo do céu e a bahia, muito raramente a laranja-da-terra para o doce apetitoso ou a lima que curava barriga de menino e de marmanjo. Depois, o vendedor de miúdo, com parada obrigatória lá por casa, onde o miolo de boi servia para manter a inteligência paterna e permitir o exercício diário da crônica.

Finalmente, na boquinha da noite, o amendoim, chamado em vernáculo deturpado de midubim, torrado e cozinhado, com a farinha embalada em saquinhos coloridos, dando água na boca. Todos os dias, porém, a matraca do mascate anunciava a variedade de suas miudezas: linha pra coser e dedal, agulhas de todos os tipos, alfinetes e tesouras!

E o doce japonês? Anunciado com o trinar de um apito! Ou o cavaquinho? De cujo triângulo de metal o vendedor musicalizava a oferta! 

E o homem do cuscuz, madrugador, sempre, trazendo a comida em rodelas, molhando com leite de côco e dando gosto ao acepipe? Ninguém vê mais! 

Maçã e pêra eram frutas raras e somente aos doentes servidas, uva não se via, morango muito menos e ameixa só de lata.

Nas esquinas de Salvador de hoje ou nos semáforos das grandes avenidas vende-se o exótico, as frutas do frio e do sul! 

Agora o abacaxi que quebra o jejum ou a laranja cravo pra distrair o estômago, mostrando da regra a exceção!




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