Por isso comecei a escrever o meu diário, que eu já devia ter começado desde os 7 anos. Mas nessa idade a gente só escreve babaquices, coisas assim: “A Adalgiza caminha como um saca-rolhas” ou “Pusemos na professora o apelido de Dona Programática”.
Uma vez me fui com outros meninos e meninas que também tinham merecido uma visita pública ao Jardim Botânico, que me pareceu pequeno demais porque constava apenas de uma cúpula de vidro. Havia uma enorme fila de turistas e visitantes domingueiros. Lá dentro não era apenas ar condicionado, era um vento leve, quase uma brisa, nos explicou o professor. Uma brisa que agitava os cabelos da gente e as folhas da árvore. Sim, porque lá dentro só havia uma árvore, a única árvore do mundo e que se chamava simplesmente “a árvore”, pois não havia razão para a diferenciar de outras. Suas folhas se agitavam e tinham um cheiro verde. Não sei se me explico bem.
Não importa: este diário é secreto e será queimado publicamente com outros, de autoria de meninos da minha idade, quando atingirmos os 70 anos.
Dona Programática nos explicou a necessidade desses diários porque, “para higiene da alma e preservação do indivíduo, todos têm direito a uma vida secreta, ao contrário do que acontecia nos tempos da Inquisição, da Censura, do Dr. Freud e dos entrevistadores jornalísticos.
Isto diz dona Programática. Mas o nosso professor de Redação, que não é tão cheio de coisas, diz que esses nossos diários secretos servem prá gente dizer besteiras só por escrito, em vez de as dizer em voz alta.
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