sábado, 16 de julho de 2011

DUAS ESCOVAS E UM COPO.

No começo, era só amizade: colegas de faculdade, resolveram repartir o aluguel de um pequeno apartamento. Aparentemente nada tinha a ver com sexo, mas já na segunda noite, ele se introduziu na cama dela de mala e cuia e a partir daí, nasceu uma paixão furiosa, uma paixão que ela mesma, como disse às amigas, jamais tinha experimentado. Desnecessário dizer que os dois estavam muito felizes, e que se congratulavam pela brilhante idéia que tinham tido de partilhar a moradia.

Os meses passaram e, como sempre acontece, a rotina foi substituindo a paixão. Não que fosse uma rotina desagradável, pelo contrário. Ambos gostavam das mesmas coisas, dos mesmos livros, dos mesmos CDs e da mesma comida. Descobriram que a calma convivência pode ser tão gratificante quanto o sexo. E ele se declarava muito feliz.

Ela também. Mas na verdade, não se sentia inteiramente feliz, por causa de um pequeno e insignificante detalhe: o banheiro.

Havia um único banheiro. Minúsculo e com um armário igualmente minúsculo. Nesse armário, guardavam o mínimo de coisas possíveis: pente, escova para cabelo, desodorante e alguns comprimidos. Ah, sim, e o copo com as duas escovas de dente.

Esse copo a incomodava. Muito. Muitíssimo. Aliás, não exatamente o copo, mas as escovas. E não exatamente as escovas: a escova. A dele.

Era uma escovona enorme, com um cabo retorcido, e, o que era pior ainda, uma cor horrorosa, um amarelo-gema-de-ovo, cuja visão a deixava doente. A escova dela, ao contrário, era pequena e delicada, de uma cor-de-rosa muito pálida. Ou seja: a escova amarelona afirmava, de forma gritante e desesperada, a sua superioridade. E aquilo ela não podia suportar.

Várias vezes lhe pediu que trocasse de escova. No começo, ele levou na brincadeira, não deu bola. Quando ela insistiu, respondeu de maus modos. Pela primeira vez, brigaram e ela chorou.

A briga se repetiu e eles acabaram por se separar. E, separados, ela descobriu o quanto o amava. Telefonou-lhe, implorou por uma reconciliação. Inútil. Ele já tinha arranjado outra namorada.

Hoje ela mora sozinha. No minúsculo armário do seu minúsculo banheiro, há um copo com duas escovas. Uma é a dela: pequena e delicada. A outra, que comprou depois de muito pesquisar, é uma escovona amarelo-gema-de-ovo, de cabo retorcido, enorme e horrorosa.

Cada vez que ela olha essa escova, deixa escapar um suspiro. E se lembra de que um dia foi feliz.

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