segunda-feira, 2 de maio de 2011

A HISTÓRIA DO SEU CORPO


A história do seu corpo. A aflita história do seu corpo. A triste e magnífica história de um corpo aos pedaços. E você se transformando em estrelas.

Mas não, não; a vida é dura e o corpo tem a firmeza exata que o torna capaz de ferir e ser ferido. A firmeza exata para receber o aperto da crítica e, ainda assim, não desfalecer em murchezas. Mas nem sempre é assim. Às vezes, ocorre de quebrar. Quebra tão fino e invisível que você pensa que foi na alma. Treme tão suave que você quase pensa que era prazer.

Daí a sua mania de perdoar o imperdoável. E de se curvar assim bem baixinho para não machucar os frágeis olhos de seu algoz. Ele não suporta olhar para você. Você, insuportável, esconde-se. Tem mania de servir. Falta-lhe a ousadia de quem chora: você perdeu até as lágrimas. Caídas despedaçadas numa estrada qualquer, que ficou ali onde o tempo esconde respiros e assobios.

Range o tempo e marca o corpo. Você nem sabe que suas linhas são mapas e que suas dobras são infinitudes montanhosas e reentrâncias alegres: dentro de uma dobra sua existe um grito. E um dia ele vai se soltar fino feito um passarinho e voar, voar, voar até quebrar macio em ondas quaisquer. Tudo em você é qualquer – mas em mim também. Tudo, tudo é qualquer, mas a gente inventa formas bonitas e rituais protetores. Gosto deles, aliás, desses rituais. Estão, pelo menos, cheios de lágrimas. E contam histórias de um passado que cantava. Bem fina a melodia a perder de vista: o amor perdido e a vila devastada. 

Os donos do mundo pegaram você. E você se esqueceu de que o corpo é infinitável. O corpo é a alma: não tem data de nascimento nem espreita o fim – apenas segue amaciando-se em carícias e dores, lamentos e sabedorias, até o dia em que se torna terra. 

Não morre. A vida é para além de você, entende? Não é você quem viverá para sempre, é ela quem sempre existirá.

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